Rosetta vem acender o debate sobre a origem dos oceanos na Terra

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CopyrightSpacecraft: ESA/ATG medialab; Comet: ESA/Rosetta/NavCam; Data: Altwegg et al. 2014 and references therein

A nave Rosetta da ESA descobriu que o vapor de água do cometa que está a estudar é significativamente diferente daquele que encontramos na Terra. A descoberta acende o debate acerca das origens dos oceanos no nosso planeta.
As medições foram feitas no mês que se seguiu à chegada da nave ao cometa 67P/Churyumov–Gerasimenko, a 6 de agosto. Este é um dos resultados mais esperados da missão, já que a origem da água na Terra ainda é uma questão em aberto.
Uma das hipóteses principais para a formação da Terra prevê que esta estivesse tão quente quando se formou, há 4,6 mil milhões de anos, que qualquer água que pudesse existir ter-se-ia evaporado. Mas, hoje, dois terços da superfície da Terra estão cobertos de água, então de onde veio esta água?
Neste cenário, deverá ter sido ‘entregue’ depois de o nosso planeta ter arrefecido, muito provavelmente depois de colisões com cometas e asteróides. A contribuição relativa de cada classe de objetos no fornecimento de água ainda está em discussão.
A chave para determinar as origens da água está no seu ‘sabor’, neste caso a proporção de deutério – uma forma de hidrogénio com um neutrão extra – relativamente ao hidrogénio normal.
Esta proporção é um indicador importante da formação e evolução inicial do Sistema Solar, com as simulações teóricas a mostrarem que esta deverá mudar com a distância do Sol e com o tempo nos primeiros milhões de anos.
Um dos principais objetivos é comparar o valor entre diferentes tipos de objetos com os medidos para os oceanos terrestres, de forma determinar quanto de cada objecto pode ter contribuído para a água na Terra.

Copyright: ESA/Rosetta/NAVCAM – CC BY-SA IGO 3.0

Os cometas, em particular, são peças chave no estudo do Sistema Solar primitivo: contêm material que sobrou do disco protoplanetário, a partir dos quais os planetas se formaram, e por isso deverão reflectir a composição primordial dos seus locais de origem.
Mas graças à dinâmica do Sistema Solar primitivo, este não é um processo simples. Os cometas de período longo, que vêm da distante nuvem de Oort, formaram-se na região de Urano-Neptuno, a uma distância suficiente do Sol para que a água gelada pudesse sobreviver.
Espalhando-se depois pelo Sistema Solar, como resultado das interacções gravitacionais com os planetas gigantes gasosos, à medida que estes estabilizavam nas suas órbitas.
Já relativamente aos cometas da família de Júpiter, como o cometa de destino da missão Rosetta, pensa-se que se terão formado na Cintura de Kuiper, para lá de Neptuno. Ocasionalmente, estes corpos são desviados deste local e enviados na direção do Sistema Solar interior, onde as suas órbitas passam a ser controladas pela influência gravitacional de Júpiter.
De facto, o cometa da Rosetta viaja agora à volta do Sol, entre as órbitas da Terra e de Marte, no ponto mais próximo, e um pouco além de Júpiter, no ponto mais afastado, com um período de 6,5 anos.
Medições anteriores da relação entre deutério/hidrogénio (D/H) noutros cometas mostraram uma ampla margem de valores. Dos onze cometas para os quais foram feitas medições, só o cometa da família de Júpiter, o 103P/Hartley 2, apresenta uma relação compatível com a composição da água na Terra, em observações feitas pela missão da ESA, Herschel, em 2011.
Por outro lado, os meteoritos, vindos da Cintura de Asteroides, também coincidem com a composição da água na Terra. Apesar de os asteróides terem um conteúdo de água muito menor, o impacto de uma grande quantidade deles poderia ter resultado na água dos oceanos terrestres.
É neste cenário que as investigações da Rosetta são importantes. O rácio entre o deutério e o hidrogénio medido pelo espectómetro de ROSINA, da Rosetta, é mais do que três vezes maior do que o dos oceanos na Terra e do que o do seu companheiro da família de Júpiter, o cometa Hartley 2. Aliás, é mais elevado do que o de qualquer outro cometa da nuvem de Oort também.

Copyright: ESA

“Esta descoberta surpreendente poderá indicar uma origem diferente para os cometas da família de Júpiter – é possível que se tenham formado ao longo numa área maior do Sistema Solar do que se pensava anteriormente,” disse Kathrin Altwegg, investigadora principal para o ROSINA e primeira autora do artigo com estes resultados, publicado na revista Science desta semana.
«A nossa descoberta também exclui a hipótese de os cometas da família de Júpiter conterem apenas água semelhante à dos oceanos em Terra, e dá força aos modelos que apresentam os asteróides como a origem preferencial para a água dos oceanos terrestres.»
“Nós sabíamos que os resultados da análise in situ do cometa seriam sempre uma surpresa para a ciência do Sistema Solar System e esta observação espantosa vem com certeza acender o debate sobre as origens da água na Terra,” diz Matt Taylor, cientista de projecto da ESA.

Copyright: Data from Altwegg et al. 2014 and references therein

“Enquanto a Rosetta continua a seguir o comet ana sua órbita à volta do Sol, durante o próximo ano, estaremos a analisar como evolui e se comporta, o que nos dará uma visão única acerca do misterioso mundo dos cometas e o seu contributo para a nossa compreensão da evolução do Sistema Solar.”

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